O regime jurídico das parcerias público-privadas no direito português
1.Breve perspectiva da legislação portuguesa no sector imobiliário
No Direito Português está em curso um verdadeiro ciclo de revisão legislativa no sector imobiliário.
No início deste ano, foram publicados diversos diplomas, nomeadamente, o DL nº 12/2004, de 9 de Janeiro, que regulamenta o regime jurídico de ingresso e permanência na actividade da construção, a Portaria nº14/2004, de 10 de Janeiro, que estabelece os requisitos e procedimentos a cumprir para a concessão e revalidação dos títulos de registo, a Portaria nº15/2004, de 10 de Janeiro que estabelece as taxas devidas pelos procedimentos administrativos referentes à emissão de alvarás e títulos de registo relativos à actividade da construção, a Portaria nº16/2004, de 10 de Janeiro, que estabelece o quadro mínimo de pessoal das empresas classificadas para o exercício da actividade da construção, a Portaria nº 17/2004, de 10 de Janeiro, que estabelece a correspondência entre as classes das habilitações constantes dos alvarás das empresas de construção e os valores das obras que os seus titulares ficam autorizados a executar, a Portaria nº 18/2004, de 10 de Janeiro, que estabelece quais os documentos comprovativos do preenchimento dos requisitos de ingresso e permanência na actividade da construção e a Portaria nº 19/2004, de 10 de Janeiro, que estabelece as categorias e subcategorias relativas à actividade da construção, bem como o DL nº6/2004, de 6 de Janeiro, que estabelece o regime de revisão de preços das empreitadas de obras públicas e de obras particulares.
Foi já anunciado pelo governo que o novo Regime de Edificação Urbana (RGEU) esta praticamente concluído, sendo este diploma o que constituirá a base do regulamento referente à construção.
O governo igualmente informou num seminário recentemente promovido pela Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas a propósito do tema “ Economia da Construção” que o novo diploma que irá regulamentar o Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas também está quase concluído, com adaptação ao regime comunitário.
Foi também aprovada em 3 de Junho deste ano um novo decreto-lei, ainda não promulgado à data da elaboração deste trabalho, que regula a nova Lei de Mediação Imobiliária, estando prevista também uma nova Lei de Arrendamento Urbano para breve.
Todas estas novas regulamentações aliadas às igualmente recentes alterações do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e do Código do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (CIMT) alteram profundamente o regime da construção civil, do direito imobiliário e respectivos direitos conexos em Portugal, tendo em vista a agilização do sector e uma harmonização com as normas comunitárias.
Afigura-se-me que este enquadramento inicial embora não integrando o tema será do interesse dos Meus Colegas, uma vez que estamos em sede de direito comparado.
2. A génese das Parcerias Público-Privadas em Portugal
Em Portugal, o conceito de PPP só está divulgado há muito pouco tempo.
As primeiras experiências ocorreram com as concepções SCUT, que se traduziram num sistema de concepção, construção, conservação e exploração de lanços de auto-estradas em regime de portagem sem cobrança aos utilizadores ou portagem virtual, cujo regime foi aprovado pelo DL 267/97, de 2 de Outubro.
As SCUTS permitiram a construção de cerca de mil quilómetros de auto estradas com a parceria de entidades privadas que suportam a formação de capital e os correspondentes riscos inerentes às tarefas objecto da concessão.
As PPP com recurso ao Project Finance substituem o modelo tradicional com os custos repartidos entre o investimento inicial e os custos de exploração, por custos de prestação de serviços a serem pagos a partir da entrada do investimento em exploração, revertendo os bens para a entidade pública concedente no fim do período da concessão.
Anteriormente, o contrato de concessão celebrado com um consórcio privado criado para a edificação da Ponte Vasco da Gama, denominado Lusoponte, foi a primeira experiência de um contrato de Project Finance aprovado pelo Decreto Lei nº168/94, de 15 de Junho, tratando-se de um contrato de concessão, cujas bases incluíam a concepção, o projecto, a construção, o financiamento, a exploração e a manutenção pelo concessionário, limitando-se as obrigações do concedente Estado, em matéria de financiamento, à entrega de um subsídio atribuído pela União europeia, sem prejuízo do direito de reequilíbrio financeiro que assiste à concessionária.
O Project Finance consubstancia uma modalidade de financiamento garantido pelas receitas, activos e direitos de um projecto específico, tratando-se de uma estrutura de financiamento baseada na actividade de um dado projecto e não na análise de crédito da entidade privada como sucede no corporate finance. O Project Finance está pois baseado na capacidade do projecto em gerar recursos que garantam o pagamento e remuneração do capital investido.
O Tribunal de Contas, no âmbito de auditoria à aplicação do modelo contratual e aos acordos de reposição financeira à concessão Estado-Lusoponte (Relatório nº 31/2000, 2ª secção, Junho de 2000) define Project Financing como “ um meio de transferência para o sector privado da responsabilidade da construção, financiamento e exploração de grandes empreendimentos públicos, que tradicionalmente eram desenvolvidos pelo sector público”, acrescentando “a estrutura financeira de um Project finance é alicerçada na expectativa dos meios financeiros a libertar pelo projecto, sem necessidade efectiva de recorrer às tradicionais formas de garantias a prestar pelos governos, ou pelas entidades privadas envolvidas no desenvolvimento do projecto. São os cash-flows gerados pela exploração do empreendimento que deverão, por si só garantir a cobertura dos encargos de financiamento e assegurar a remuneração desejada para os capitais próprios investidos”.
A assumpção de risco assumida pela entidade privada é contrabalançada, nos termos do contrato de concessão, pela previsão de cláusulas de excepção que atribuem ao concessionário um direito à reposição do equilíbrio financeiro, nos termos de uma equação financeira complexa.
3. Parcerias em Saúde
3.1. Regulamentação jurídica de parcerias em saúde
A primeira abordagem legal do desenvolvimento de parcerias e financiamento privados surgiu com o Decreto-lei nº185/2002 de 20 de Agosto que define o regime jurídico das Parcerias em saúde com gestão e financiamentos privados.
Conforme se lê no preâmbulo deste Decreto-lei, as parcerias em saúde visam fundamentalmente obter melhor serviços com partilha de riscos e benefícios mútuos entre as entidades públicas que têm as responsabilidades pelos serviços públicos e outras entidades que se lhe associam com carácter duradouro. O contrato de gestão torna-se um instrumento privilegiado que reveste a natureza de um verdadeiro contrato de concessão de serviço público.
Vem assim definido no art. 8º nº2 “ o contrato de gestão pode ainda ter por objecto a concepção, construção, financiamento, conservação e exploração do estabelecimento, ou de parte funcionalmente autónoma.”
O art. 10º para além de referir a necessidade de garantias de idoneidade, qualificação técnica e capacidade financeira que a entidade gestora deve oferecer, exige que se trate de uma sociedade comercial com sede e administração principal localizadas em Portugal e cujo objecto exclusivo deve ser o exercício da actividade a conceder.
O art. 11º clarifica que o contrato de gestão não pode exceder o prazo de 30 anos, podendo contudo ser prorrogado em termos contratuais.
O art. 14º dispõe que o programa de procedimento prévio à contratação, bem como o caderno de encargos tipo do contrato de gestão são aprovados por decreto regulamentar, sendo o programa do procedimento e o caderno de encargos específicos relativos a cada um dos contratos de gestão aprovados por despacho do Ministro da Saúde.
Os deveres da entidade gestora vêm enunciados no art.16º, dos quais salientamos a necessidade de esta afectar à execução da obra e à exploração do serviço os meios humanos, técnicos e financeiros necessários à boa execução do contrato, bem como, o de efectuar os trabalhos necessários à boa conservação das instalações e equipamentos e o de acompanhar a evolução técnica do processo de exploração adoptado, mantendo os parâmetros de qualidade definidos no contrato.
A entidade gestora deverá ainda cumprir as regras e princípios comunitários sobre contratação pública relativas a realização de empreitadas de obras públicas, não podendo alterar o seu objecto social, nem reduzir o capital social, nem tão pouco alienar o capital social a terceiros ou ceder a sua posição contratual ou proceder à transformação, fusão, cisão ou dissolução da sociedade sem prévia autorização da entidade pública contratante sob pena de nulidade do acto.
O mesmo diploma estabelece no art. 18º as modalidades de remuneração da entidade gestora, bem como no art. 22º a responsabilidade da entidade gestora pela obtenção do financiamento necessário ao desenvolvimento de todas as actividades que integram o objecto do contrato, não sendo oponíveis à entidade pública contratante quaisquer excepções ou meios de defesa que resultem dos contratos de empréstimos estabelecidas pela entidade gestora com as suas entidades financiadoras.
O art. 33º prevê que quaisquer litígios deverão ser resolvidos por recurso à arbitragem, devendo os respectivos contratos estabelecer a composição e regras de funcionamento dos tribunais arbitrais.
3.2. Regulamento das condições gerais dos procedimentos prévios à celebração dos contratos
O Decreto Regulamentar nº10/2003, de 28 de Abril, veio aprovar as condições gerais dos procedimentos prévios à celebração dos contratos de gestão para as parcerias em saúde estabelecendo as seguintes fases do procedimento prévio à contratação:
a) Anúncio;
b) Acto público;
c) Qualificação;
d) Selecção das propostas;
e) Negociação;
f) Adjudicação;
g) Formação do contrato.
O anúncio para o início do procedimento é publicado na 3ª série do diário da República e no Jornal Oficial da União Europeia. O anúncio identificará a entidade pública contratante, o objecto da contratação com as indicações da duração do contrato e as condições do seu financiamento e pagamento, a natureza jurídica das entidades que podem ser admitidas a concurso, de admissão de propostas alternativas, os critérios de qualificação dos concorrentes e da apreciação das propostas, as especificidades relativas a cauções ou quaisquer garantias eventualmente exigidas, devendo ainda nele constar as demais formalidades elencadas no nº 3 do art.6º.
O art. 10º estabelece a natureza e nacionalidade dos concorrentes, podendo os concorrentes nacionais de outros estados Membros da União europeia, ou neles estabelecidos, e das partes contratantes do acordo do espaço económico europeu, concorrer em situação de igualdade com os nacionais.
Este Decreto Regulamentar fixa os documentos de qualificação e seus requisitos, o modo de apresentação da proposta e sua redacção.
No acto público são abertas as propostas e documentos dos concorrentes seguindo-se a abertura de propostas e qualificação dos concorrentes.
O art. 21º e seguintes regulamenta a possibilidade de serem efectuadas reclamações e, nesse caso, a interrupção e posterior reabertura do acto público, ao que se seguem a abertura das propostas e demais formalidades previstas nos art.s 26º a 31º.
O procedimento de qualificação dos concorrentes é realizado pela comissão de avaliação de propostas, que avalia as candidaturas, hierarquizando-as e fundamentando a qualificação prévia dos concorrentes.
Depois da apresentação das propostas definitivas pelos concorrentes pré-qualificados, a selecção das propostas é realizada perante a comissão de avaliação, sendo a lista de selecção e hierarquização enviada aos Ministros de Estado e das Finanças e da Saúde.
Segue-se a fase das negociações com os concorrentes, as quais serão efectuadas pela comissão de avaliação das propostas e a delegação representativa do concorrente. A comissão produzirá um relatório fundamentado dos resultados obtidos que terá que ser aprovado pelos referidos Ministros.
Finalmente proceder-se-á à adjudicação, sendo que a mesma pode ser revogada quando o adjudicatário não dê cumprimento às obrigações que lhe são fixadas no programa de procedimento, podendo nesse caso vir a ser adjudicada ao concorrente classificado em segundo lugar.
O concorrente deverá ainda prestar uma caução nos termos previstos no art.46º, só depois tendo lugar a formação e celebração do contrato.
4. Diploma regulamentar das Parcerias Público-Privadas
Só com o DL 86/2003, de 26 de Abril, é que o Direito Português veio regulamentar e definir as normas gerais aplicáveis à intervenção do Estado na definição, concepção, preparação, concurso, adjudicação, alteração, fiscalização e acompanhamento global das Parcerias Público-Privadas.
Este diploma define a Parceria Público-Privada no seu art.2º como o contrato ou a união de contratos por via dos quais as entidades privadas se obrigam de forma duradoura perante um parceiro público a assegurar o desenvolvimento de uma actividade tendente à satisfação de uma necessidade colectiva, e em que o financiamento e a responsabilidade pelo investimento e pela exploração incumbem total ou parcialmente ao parceiro privado.
No preâmbulo do Decreto-lei clarifica-se que o objectivo final das Parcerias Público-Privadas é utilizar a tradicional melhor capacidade de gestão do sector privado, de forma a melhorar a qualidade do serviço público que é prestado e gerar poupanças na utilização dos recursos públicos.
O nº 2 do citado art. 2º define como parceiros públicos:
a) O Estado e Entidades Públicas Estaduais;
b) Os Fundos e Serviços Autónomos;
c) As Empresas Públicas e as Entidades por elas constituídas com vista à satisfação de interesses comuns.
No nº 4 do mesmo artigo exemplificam-se alguns contratos abrangidos como instrumentos de regulamentação jurídica das relações de colaboração entre entes públicos e privados, tais como o contrato de concessão de obras públicas, o contrato de concessão de serviço público, o contrato de fornecimento contínuo, o contrato de prestação de serviços, o contrato de gestão, e o contrato de colaboração quando estiver em causa a utilização de um estabelecimento ou uma infra-estrutura já existente pertencente a outras entidades que não o parceiro público.
O nº 5 do mesmo artigo exclui expressamente do âmbito de aplicação deste decreto-lei regulamentar das normas das Parcerias Público-Privadas:
a) As empreitadas de obras públicas;
b) Os arrendamentos;
c) Os contratos públicos de aprovisionamento;
d) Todas as parcerias público privadas que envolvam um encargo acumulado actualizado inferior a dez milhões de euros ou um investimento inferior a vinte e cinco milhões de euros (excluindo – se destes montantes os provenientes de fundos comunitários);
e) Todos os outros contratos de fornecimentos de bens ou de prestação de serviços com prazo de duração igual ou inferior a três anos, que não envolvam a assumpção automática de obrigações para o parceiro público no termo ou para além do termo do contrato.
O artigo 4º define a finalidade essencial das PPP como o acréscimo de eficiência na afectação de recursos públicos e a melhoria qualitativa e quantitativa do serviço, induzida por formas e controlo eficazes que permitam a sua avaliação permanente por parte dos potenciais utentes e do parceiro público.
Os pressupostos para o lançamento e a contratação da Parceria Pública Privada são:
a) O cumprimento sempre que seja o caso das normas relativas à programação financeira plurianual constantes da lei de enquadramento orçamental;
b) A clarificação dos objectivos da Parceria com a definição dos resultados pretendidos e de uma adequada atribuição das responsabilidades as partes;
c) Um modelo de Parceria que apresente para o parceiro público vantagens relativamente a outras alternativas de alcançar os mesmos fins, e que, simultaneamente, apresente para os parceiros privados uma expectativa de obtenção de remuneração adequada aos montantes investidos e ao grau de risco em que incorrem;
d) A prévia adequação às normas aplicáveis, bem como, a obtenção das autorizações e pareceres administrativos exigidos;
e) Modelos que preferencialmente excluam quaisquer cláusulas ou regimes indemnizatórios de longo prazo por parte dos parceiros públicos aos parceiros privados;
f) A adopção das diligências e consagração das exigências adequadas à obtenção de um resultado negocial economicamente competitivo.
O art. 8º estabelece que a avaliação das PPP é feita por uma comissão de acompanhamento composta por um mínimo de dois membros e um máximo de cinco em representação de cada um dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial. A comissão de acompanhamento poderá emitir as recomendações que considere convenientes em função da evolução dos trabalhos.
Quando a Entidade encarregue pelo ministério da tutela sectorial da preparação do projecto considerar que o mesmo se encontra em estado de prosseguir para a fase de lançamento, notificará por escrito a comissão de acompanhamento e enviará os documentos necessários para instruir o ulterior despacho do ministro da tutela sectorial de lançamento da parceria.
Para além da Comissão de Acompanhamento, antes da emissão do despacho dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial que aprovam as condições de lançamento da parceria, é ainda necessário a emissão de dois pareceres independentes, não vinculativos por parte dos membros nomeados por cada um dos ministérios para a Comissão de Acompanhamento, conforme dispõe o nº7 deste art.8º.
Depois de emitidos estes pareceres, os Ministros das Finanças e da tutela sectorial aprovam mediante despacho conjunto as condições de lançamento da parceria.
O despacho conjunto dos ministros conterá:
a) O programa de concurso;
b) O caderno de encargos;
c) A análise das opções que determinaram a configuração do projecto;
d) A descrição do projecto e do seu modo de financiamento;
e) A demonstração do seu interesse público;
f) A justificação do modelo de parceria escolhida;
g) A demonstração da comportabilidade dos custos e riscos decorrentes da parceria em função da programação financeira plurianual do sector público administrativo.
Segue-se a criação de uma Comissão de avaliação das propostas, designada por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da tutela sectorial, a qual para além de avaliar o mérito relativo das propostas deve avaliar quantitativamente os riscos e encargos em que incorre o parceiro público.
Uma vez adjudicada a parceria, os poderes de fiscalização e controlo da execução são exercidos por uma entidade ou serviço a indicar pelo Ministro das Finanças para as matérias económicas e financeiras e para as demais matérias a indicar pelo Ministro da tutela sectorial.
O acompanhamento global das parcerias incumbe aos Ministros das Finanças e da tutela sectorial, procedendo ao acompanhamento permanente das parcerias, tendo por objectivo avaliar os seus custos e riscos e melhorar o processo de constituição de novas parcerias.
Os ministros deverão tomar as providências necessárias a uma divulgação eficaz dos conhecimentos adquiridos pelas entidades incumbidas do acompanhamento das parcerias, bem como a uma boa colaboração entre elas.
As parcerias podem ser alteradas por acordo das partes ou por iniciativa de qualquer delas, ao abrigo de quaisquer disposições legal ou contratualmente aplicáveis nos termos previstos no art. 14º.
Este diploma veio também alterar alguns artigos do Decreto-Lei 185/2002 de 20 de Agosto que regulamenta as Parcerias em saúde com gestão e financiamentos privados.
Cumpre salientar que o Decreto-Lei 86/2003 tem carácter imperativo, prevalecendo sobre quaisquer outras normas relativas a parcerias públicas privadas sempre que colida com outras, mesmo que criadas por regimes sectoriais especiais, conforme dispõe o seu art.3º.
5. Vantagens e desvantagens das PPP
A restrição à possibilidade de contratação de empréstimos que impliquem o aumento do endividamento líquido das entidades públicas (v.g. municípios) torna o recurso às Parcerias Público-Privadas uma forma de encontrar uma alternativa ao financiamento tradicional das autarquias locais para a implementação com maior eficiência e eficácia de infra-estruturas e equipamentos colectivos.
Este recurso à PPP permite que o município, ao vender o projecto à entidade com quem faz a parceria até venha a ter uma receita em vez de uma despesa, pois é a empresa privada que paga o projecto de arquitectura, de engenharia e ao empreiteiro.
Esta via pode, naturalmente, contribuir ainda para uma mais valia eleitoral, pois permitirá à entidade pública a realização de mais obras em tempo útil.
Porventura só em administrações seguintes, ou seja, depois de concluída a obra, é que as entidades públicas terão de pagar uma contrapartida adequada às entidades privadas, como remuneração pelo valor actualizado dos custos que estas suportaram na fase de concepção, construção, acrescida dos custos de exploração que não forem compensados por receita. É, aliás, esta provável consequência a maior desvantagem apontada a estes contratos, tendo em conta que eles são feitos por vinte ou trinta anos, ou eventualmente mais, se admitindo prorrogações.
Em Portugal os modelos de financiamento utilizados nas Scut”s foram estudados tendo em atenção um determinado volume de tráfego, que porém com a alteração do regime de portagens veio a traduzir-se num aumento significativo dos custos, porquanto com portagens reais haveria muito menos tráfego.
Na forma tradicional, as entidades públicas para obter resultados tinham, ao invés, que se financiar e contrair despesa pública inicial para efectuar os pagamentos inerentes aos projectos até os mesmos estarem concluídos.
Os modelos de financiamento com o recurso às Parcerias Público-Privadas têm ainda outra vantagem.
É que, sendo os investimentos feitos por privados, que naturalmente querem ter lucro nos negócios em que se envolvem, se os contratos acautelarem devidamente as garantias da entidade pública e do serviço público a que se destinam, ter-se-á a final seguramente um serviço que custará menos, quer em termos de investimento inicial, quer em termos de custos de exploração, quer em custos induzidos por atrasos e erros de projecto. Aliás, se assim não for, e no pressuposto que o contrato assim o acautele, é a entidade privada e não a entidade pública quer terá os prejuízos.
Portanto, será sempre de concluir que a adopção das Parcerias Público-Privadas permitem efectivamente uma alocação mais eficiente de recursos que o investimento público feito directamente pelo Estado.
6. A recente introdução das parcerias no ensino superior
As Parcerias Público-Privadas vão também avançar nas cantinas e residências do ensino superior segundo revelou recentemente o Secretário de Estado Adjunto da Ministra da Ciência e Ensino Superior.
A proposta do modelo das Parcerias Público-Privadas para colmatar falta de estruturas de acção social escolar foi feita por diversas instituições de ensino superior, entre elas a Universidade de Coimbra.
Desta forma se pretende assegurar a construção de cantinas e residências cuja construção e exploração caberá às entidades privadas, sendo o custo de tais serviços garantidos aos alunos a preços subsidiados pelo Estado.
7. Previsões de novas Parcerias Público-Privadas
O Estado Português está a prever o lançamento de vários concursos públicos para a concepção, construção e financiamento de dez novos hospitais até 2007, em regime de Parcerias Público-Privadas.
O presidente do Grupo Mello, que é o maior grupo a operar em Portugal na área da Saúde, defende um afastamento progressivo do Estado da Prestação de cuidados de saúde, aprofundando o programa das Parcerias Público-Privadas que permita aos privados passar da actual quota de mercado de 3% para 20%. Este grupo defende aliás que para resolver os problemas do Serviço Nacional de Saúde em Portugal, os privados deveriam poder chegar a uma quota de mercado de 50%.
Será talvez interessante referir que em entrevista recente ao Jornal o Diário Económico, o responsável do Grupo das Misericórdias para a Saúde (GMS), outro dos grupos que em Portugal se apresenta como interessado em ganhar concursos nesta área, calculou o custo de cada apresentação de uma proposta credível por concurso, em cerca de um milhão de euros.
Sabe-se que para a construção e gestão dos hospitais os critérios dominantes na avaliação das propostas dos concorrentes são a qualidade técnica da proposta e os encargos resultantes para o Estado.
O Secretário de Estado das Obras Públicas referiu, recentemente, em entrevista de Abril deste ano, num fórum empresarial, que “no âmbito da actividade de construção, a adopção do sistema de Parcerias Público-Privadas (PPP), nomeadamente para o desenvolvimento da rede nacional de auto-estradas, decorre do objectivo de acelerar a conclusão do plano nacional rodoviário”.
O Ministério da Justiça também admitiu o recurso a Parcerias Público-Privadas para a construção de prisões. A construção e manutenção de prisões será um exemplo de uma exploração sem carácter lucrativo, não sendo neste caso previsível que a receita venha dos utilizadores, ficando a cargo do Estado o pagamento dos serviços prestados, ganhando a entidade pública apenas as mais valias de eficiência nos projectos e construção bem como na conservação e fornecimento de serviços.
8º Conclusões
No âmbito da construção as PPP têm aplicação nos contratos celebrados entre um dono de obra pública e um empreiteiro de obras públicas, que tenha por objecto quer a execução quer conjuntamente a concepção e a execução de obras públicas, tendo como contrapartida o direito de exploração da obra acompanhada ou não do pagamento de um preço.
As parcerias entre os sectores público e privado constituem um importante instrumento estratégico de modernização e expansão dos serviços públicos, permitindo aos governos economizar meios e melhorar a eficiência e a qualidade da prestação dos serviços públicos, assegurando financeiramente a sua viabilidade futura.
Em Portugal, até ao momento, a maioria dos projectos desenvolveram-se sobretudo em grandes empreendimentos nas áreas da Energia e dos Transportes, alargada actualmente às áreas do Ambiente e da Defesa, bem como aos sectores da Saúde, Educação e Justiça.
Neste momento, Portugal dispõe já de um bom enquadramento legislativo sobre as PPP, embora na lei-quadro de 26.04.2003 esteja expressamente previsto a criação de mais regimes sectoriais especiais com normas próprias sempre que tal se justificar.
O desenvolvimento das Parcerias Público-Privadas abre assim um mercado para consultores, arquitectos, projectistas, empreiteiros, investidores, e naturalmente, também para advogados.
© UIA
JORGE LEÃO - Advogado
48º Congresso da UIA – Genebra
2 de Setembro de 2004
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